Publicar com uma editora tradicional oferece alcance, profissionalização e apoio na produção e distribuição. No entanto, o contrato também determina quanto você mantém da obra: direitos morais, direitos econômicos, formatos, territórios e prazos. Este texto apresenta, de forma prática, o que normalmente você preserva e quais pontos vale proteger no contrato.
Destaques
- Direitos morais são inalienáveis pela lei brasileira.
- Direitos econômicos podem ser limitados por formato, prazo e território.
- Cláusulas de reversão ajudam a recuperar direitos não explorados.
- Exigir aprovação para alterações criativas e delimitar direitos digitais.
- Exigir transparência financeira e participação em rendimentos.
Direitos morais: o que você nunca perde
Mesmo cedendo todos os direitos econômicos, há prerrogativas que a legislação não permite transferir. A Lei nº 9.610/1998 garante ao autor:
- Direito de paternidade: ser identificado como autor da obra ou optar pelo anonimato ou pseudônimo.
- Direito de integridade: opor-se a modificações, cortes ou adaptações que desrespeitem a obra ou prejudiquem sua reputação.
- Direito de divulgação e retirada: decidir quando a obra será divulgada e, em situações específicas, requerer a retirada de circulação (podendo implicar indenização conforme o contrato).
Exemplo prático: a editora não pode atribuir a autoria a outra pessoa nem mutilar o texto sem sua concordância, a menos que o contrato permita alterações previamente autorizadas.
Direitos econômicos: o que normalmente você mantém e o que cede
Os direitos econômicos permitem explorar comercialmente a obra — reprodução, distribuição, adaptação, tradução etc. Eles podem ser cedidos total ou parcialmente, por prazo determinado e para territórios específicos. Commonmente, o autor busca manter ou negociar os seguintes pontos:
- Limitação por formato e mídia: ceder direitos para edições específicas (por exemplo, apenas edição impressa em língua X) e reservar outros formatos (audiolivros, e-books, adaptações) para negociação separada.
- Duração e território: preferir prazos definidos (ex.: 5–10 anos) e territórios específicos (Brasil ou países de língua portuguesa).
- Direitos subsidiários: traduções, cinema, merchandising, etc. O contrato deve indicar quem fica com esses direitos, e o autor pode exigir participação nos rendimentos dessas negociações.
- Remuneração e prestação de contas: garantia de adiantamento, royalties e cláusula de auditoria ou prestação de contas clara sobre vendas.
Comparação rápida:
Critério | Ceder todos os direitos | Licença exclusiva por tempo definido |
---|---|---|
Alcance | Global e amplo | Território específico (ex.: Brasil) |
Duração | Indefinida | Definida (ex.: 5–10 anos) |
Controle criativo | Reduzido | Mais preservado |
Rendimentos | Receitas integralmente pela editora | |
Recuperação de direitos | Difícil | Mais fácil após o prazo |
Cláusulas práticas para preservar direitos — o que negociar
- Reversão de direitos: cláusula automática se a editora não explorar a obra por determinado período ou se ficar fora de catálogo. Defina critérios claros (ex.: zero vendas em 24 meses; sem novas tiragens por 12 meses).
- Autorização para alterações: aprovação prévia para mudanças substanciais no texto, prefácio ou título. Pequenas correções podem ficar com a editora, mas alterações criativas devem passar por você.
- Direitos digitais e derivados: separar explicitamente e-book, audiobook, app, adaptação audiovisual e traduções. Considere concedê-los apenas mediante negociação posterior ou com participação maior nas receitas.
- Transparência financeira: inclua frequência de prestação de contas e direito de auditoria por terceiros de confiança.
- Uso promocional e trechos: negociar a possibilidade de usar trechos da obra em seu site, em conferências ou em compilações próprias sem que isso conte como violação contratual.
- Rescisão e indenização: defina como funciona a rescisão contratual e quais compensações são devidas em caso de descumprimento.
Nota: considere a avaliação de um advogado especializado em direitos autorais ou de uma associação de escritores antes de assinar.
Breve história ilustrativa
Um autor iniciante assinou contrato que cedia globalmente os direitos de tradução e audiovisual sem prazo definido. Anos depois, uma produtora estrangeira quis adaptar o livro, e o autor teve pouco poder de negociação e participação nos rendimentos. Se tivesse mantido ou condicionado esses direitos, poderia ter garantido melhor participação e controle criativo.
Conclusão
Publicar com uma editora tradicional oferece suporte editorial, distribuição e visibilidade, mas não precisa significar abrir mão de todo o controle. Pela lei brasileira, os direitos morais são do autor, e os direitos econômicos podem (e devem) ser negociados com clareza sobre formatos, territórios e prazos. Ao assinar, priorize cláusulas de reversão, delimitação de mídias, aprovação de alterações e transparência financeira. Sempre que possível, busque a avaliação de um advogado especializado ou de uma associação de escritores antes de assinar. Assim você equilibra os benefícios da editora com a preservação do essencial: a autoria e o futuro da obra.